ODS 14: Vida na Água

Luiz Carlos Aceti Junior[1]

Maria Flavia Curtolo Reis[2]

Lucas Reis Aceti[3]

Conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável.

            A Amazônia NÃO é o pulmão do mundo! Os oceanos, sim, através das algas marinhas, são o verdadeiro pulmão do mundo, já que produzem, através da fotossíntese, mais oxigênio do que precisam na respiração e o excedente é liberado para o ambiente.  Basta observar que 70% do território planetário é coberto por oceanos, enquanto a porção terrestre do planeta equivale a 30%. E a parte terrestre não é uniforme a ponto de conter em toda a sua extensão vegetação em larga escala. Alguns exemplos disso são a Antártida, o Deserto do Saara, o Deserto do Atacama e a Cordilheira do Himalaia.

            “A maior parte do oxigênio que está na atmosfera é produzido por microalgas que vivem nos oceanos. O mesmo processo que ocorre na Amazônia, de fotossíntese, também acontece com as plantas que vivem nos mares, que são as algas. E toda a superfície do oceano é repleta de microalgas. Como eles cobrem cerca de 70% da Terra, a produção é enorme — explica a mestre em oceanografia física Mariana Thévenin”.

            A introdução é uma pequena demonstração do grau de importância dos oceanos para a vida em geral. Dados da ONU apontam que os “oceanos são a maior fonte de proteína do mundo, com mais de 3 bilhões de pessoas dependendo dos oceanos como fonte primária de alimentação. Que a pesca marinha direta ou indiretamente emprega mais de 200 milhões de pessoas. Que mundialmente, o valor de mercado dos recursos marinhos e costeiros e das indústrias é de 3 trilhões de dólares por ano ou cerca de 5% do PIB (produto interno bruto) global.

            Os oceanos, apesar de toda essa importância e de ser fonte de vida, pela produção de oxigênio e de alimento, são ameaçados diariamente pela ação (e omissão) humana.  Alguns exemplos a seguir demonstram que há muito trabalho a ser feito para que a humanidade mantenha uma relação saudável com o Planeta, notadamente com os oceanos:

  • Em agosto de 2019, um derramamento de óleo (que até hoje não foi elucidado) teria sido ocasionado por navios cargueiros, na região marítima do nordeste do Brasil, atingiu diversas áreas do litoral brasileiro, percorrendo a costa da Paraíba até o Espírito Santo; o óleo, obviamente, não se desloca apenas para uma região, o que significa que além das praias, rumou para o mar aberto, ameaçando espécies de animais, algas, corais, prejudicando pesca. Cerca de 5 mil toneladas do material teriam sido coletadas, segundo levantamentos feitos pelo Ibama, Marinha e outros órgãos que participaram da coleta. Se realmente o derramamento ocorreu por vazamento de um navio, não há equipamentos de controle nas embarcações? E se há, por que não houve comunicação imediata com as autoridades? Provavelmente, a embarcação não acionou as autoridades porque o custo de reparação ao dano ambiental e possíveis ações indenizatórias seriam elevadíssimos. A legislação brasileira é rigorosa e impõe sanções administrativas, criminais e cíveis, sempre visando a reparação ambiental com o retorno ao status quo ante.
  • Existem, por mais ridículo e absurdo que pareça, 5 (cinco) ilhas de plástico e resíduos sólidos nos oceanos do planeta. Segundo o site Iberdrola, https://www.iberdrola.com/meio-ambiente/as-5-ilhas-de-lixo-nos-oceanos, “Algumas destas manchas de lixo — como a do Pacífico Norte — têm uma superfície como a França, Espanha e Alemanha juntas”. “Estes resíduos destroçam os ecossistemas marinhos ao provocarem a morte de mais de um milhão de animais por ano”.  (Um trabalho publicado em 2016, pela fundação Ellen MacArthur Foundation, aponta que em 2050 haverá mais plásticos que peixes, em peso, nos oceanos. Mesmo que esses números possam eventualmente ser questionados, não há como negar a gravidade do fato. A humanidade não pode continuar produzindo lixo e descartar nos oceanos ou em terra da forma como vem sendo feito. E também não é necessário ser um especialista para se observar a quantidade de lixo jogado nas águas, nas ruas. )
  • Nos jogos olímpicos de 2016, cogitou-se de não serem realizadas as provas de vela e windsurfe na Baia de Guanabara, por causa do esgoto lançado sem tratamento. O site Diário do Rio reportou em 2019 que “A Baía de Guanabara recebe 1 bilhão de litros de chorume por ano.” (A arrecadação de impostos no Brasil é grande o suficiente para haver obras de saneamento básico e sanar a vergonha de em pleno 2020 somente 53% da população ter acesso a rede de esgoto (SNIS 2018). Em outubro/2011 o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgou o Censo 2010 em que informava que o percentual de munícipios com rede coletora de esgotos estava em torno de 55% para todo o país em 2008. Mas, infelizmente, saneamento não dá votos.)                     
  • Dados da ONU apontam que Mundialmente, os níveis de captura de peixes estão próximos da capacidade de produção dos oceanos, com 80 milhões de toneladas de peixes sendo pescados. (O exemplo a seguir, apesar de não se referir a pesca marinha, pode muito bem servir de exemplo de como é viável e sustentável buscar alternativas de produção pesqueira sem retirar da natureza sua capacidade de recuperação: a revista Safra http://revistasafra.com.br/producao-sustentavel-de-peixes/ divulgou em novembro de 2019 uma reportagem sobre o trabalho conjunto da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) com a Itaipu Binacional objetivando um acordo de cooperação técnico-científica para a produção de peixes com bioflocos- BFT (Biofloc Tecnology). A parceria trará inúmeros benefícios, como pesquisa e desenvolvimento de tecnologias de produção de peixes, fomento de emprego e renda a piscicultores, treinamento de profissionais, disseminação de práticas e de produção de peixes de modo mais sustentável, qualidade da água etc. A parceria atende também as necessidades do setor produtivo e da agenda de desenvolvimento sustentável da ONU. Este relato demonstra que é possível buscar alternativas que aliem sustentabilidade e desenvolvimento. E o Brasil há muito já deveria ter se tornado um gigante nesse assunto, dada a riqueza hidrográfica que possui, a extensão de sua costa. Novamente, a escassez de políticas públicas sérias e competentes prejudica o desenvolvimento do país). 

A Lei 6.938/81, que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida. A finalidade é assegurar no País, condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana. Com relação ao tema deste ODS, merecem destaque os princípios da racionalização do uso da água, ações governamentais na manutenção do equilíbrio ecológico por se tratar de patrimônio público e coletivo, planejamento e fiscalização do uso dos recursos ambientais, incentivos ao estudo e à pesquisa de tecnologias orientadas para o uso racional e a proteção dos recursos ambientais, educação ambiental, inclusive a educação da comunidade, objetivando capacitá-la para participação ativa na defesa do meio ambiente. (Artigo 2º).

Nota-se que há muito tempo o Brasil tem legislação demonstrando sua preocupação ambiental.

No que se refere a proteção ambiental e sustentabilidade dos recursos marinhos, em 1982, a ONU realizou a primeira Convenção da Nações Unidas sobre legislação do Mar (conhecida internacionalmente por UNCLOS) da qual o Brasil é signatário. A Convenção teve início de vigência somente em 1994. No Brasil, a Lei 8617/93 definiu os limites do mar territorial sob jurisdição nacional estabelecidos pela convenção.  Foram definidas 05 zonas: Mar territorial, que se estende por 12 milhas náuticas a partir da costa; Zona contígua: 12 milhas adicionais a partir do Mar territorial; Zona Econômica Exclusiva (ZEE): 200 milhas náuticas a partir da costa; Plataforma continental: trata-se do leito e subsolo das áreas submarinas compreendendo de 200 até 350 milhas náuticas a partir da costa e finalmente o Mar aberto. Com exceção do mar aberto o Brasil exerce sua soberania nos limites anteriormente estabelecidos.

Em 2005, o Decreto 5.377/2005 aprovou a Política Nacional dos Recursos para o Mar-PNRM e a partir do PNRN criou-se o Plano Setorial para os Recursos do Mar (PSRM), cuja vigência é plurianual.  O último deles é o IX PSRM com vigência de 2016/2019. Os objetivos estabelecidos foram “conhecer e avaliar as potencialidades do mar, bem como monitorar os recursos vivos e não vivos e os fenômenos oceanográficos e do clima das áreas marinhas sob jurisdição e de interesse nacional, visando à gestão, ao uso sustentável desses recursos e à distribuição justa e equitativa dos benefícios derivados dessa utilização.” O PSRM adota gestão participativa integrada de vários Ministérios, como Meio Ambiente, Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Ministério de Minas e Energia, entre outros, além da Marinha do Brasil, ICMBio, IBAMA além de órgãos de fomento, comunidades acadêmica e científica e iniciativa privada, tanto na sua elaboração quanto na execução de ações conjuntas, e em consonância com as diretrizes estabelecidas na PNRM e com as demais legislações.

            Com relação a este tema, os objetivos da ONU, que foram estabelecidos a partir da Conferência Rio +20, são:

  1. Até 2025, prevenir e reduzir significativamente a poluição marinha de todos os tipos, especialmente a advinda de atividades terrestres, incluindo detritos marinhos e a poluição por nutrientes.
  2. Até 2020, gerir de forma sustentável e proteger os ecossistemas marinhos e costeiros para evitar impactos adversos significativos, inclusive por meio do reforço da sua capacidade de resiliência, e tomar medidas para a sua restauração, a fim de assegurar oceanos saudáveis e produtivos.  
  3. Minimizar e enfrentar os impactos da acidificação dos oceanos, inclusive por meio do reforço da cooperação científica em todos os níveis.
  4. Até 2020, efetivamente regular a coleta, e acabar com a sobrepesca, ilegal, não reportada e não regulamentada e as práticas de pesca destrutivas, e implementar planos de gestão com base científica, para restaurar populações de peixes no menor tempo possível, pelo menos a níveis que possam produzir rendimento máximo sustentável, como determinado por suas características biológicas. (Leis que protejam os ecossistemas e uma economia sustentável são indispensáveis. Mas elas somente terão eficácia se houver fiscalização e punição rígidas. O Brasil possui um litoral com 7.367 km, que aumenta para 9.200 km se se considerarem as saliências e reentrâncias do litoral. É um imenso desafio a ser vencido.).
  5. Até 2020, conservar pelo menos 10% das zonas costeiras e marinhas, de acordo com a legislação nacional e internacional, e com base na melhor informação científica disponível.
  6. Até 2020, proibir certas formas de subsídios à pesca, que contribuem para a sobrecapacidade e a sobrepesca, e eliminar os subsídios que contribuam para a pesca ilegal, não reportada e não regulamentada, e abster-se de introduzir novos subsídios como estes, reconhecendo que o tratamento especial e diferenciado adequado e eficaz para os países em desenvolvimento e os países menos desenvolvidos deve ser parte integrante da negociação sobre subsídios à pesca da Organização Mundial do Comércio. (A ONU relata que “subsídios para a pesca estão contribuindo para a rápida diminuição de várias espécies de peixes e estão impedindo esforços para salvar e restaurar a pesca mundial e empregos relacionados, causando redução de 50 bilhões de dólares em pesca nos oceanos por ano”).
  7. Até 2030, aumentar os benefícios econômicos para os pequenos Estados insulares em desenvolvimento e os países menos desenvolvidos, a partir do uso sustentável dos recursos marinhos, inclusive por meio de uma gestão sustentável da pesca, aquicultura e turismo.
  8. Aumentar o conhecimento científico, desenvolver capacidades de pesquisa e transferir tecnologia marinha, tendo em conta os critérios e orientações sobre a Transferência de Tecnologia Marinha da Comissão Oceanográfica Intergovernamental, a fim de melhorar a saúde dos oceanos e aumentar a contribuição da biodiversidade marinha para o desenvolvimento dos países em desenvolvimento, em particular os pequenos Estados insulares em desenvolvimento e os países menos desenvolvidos.
  9. Proporcionar o acesso dos pescadores artesanais de pequena escala aos recursos marinhos e mercados.
  10. Assegurar a conservação e o uso sustentável dos oceanos e seus recursos pela implementação do direito internacional, como refletido na UNCLOS [Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar], que provê o arcabouço legal para a conservação e utilização sustentável dos oceanos e dos seus recursos, conforme registrado no parágrafo 158 do ‘Futuro Que Queremos’.

            A poluição parece uma sombra humana: onde quer que esteja, há resíduos, poluição, lixo, sujeiras variadas. É preciso educar e conscientizar a população sobre suas responsabilidades individuais e coletivas com relação ao fato de que aquilo que se planta, colhe. Se a sociedade produz riquezas e descarta os resíduos na natureza, logo colherá doenças, baixa produtividade e exaustão das riquezas naturais.

Não adianta falar para as pessoas que as gerações futuras precisam de um meio ambiente saudável. As pessoas precisam entender que preservar e produzir com sustentabilidade garantem o seu “agora” e o futuro delas e da sociedade. É preciso associar higidez e sustentabilidade a uma boa qualidade de vida. Cobrar responsabilidade e honestidade de si mesmo e dos familiares, do vereador, do prefeito, governadores, deputados, senadores, juízes, promotores, ministros e presidente da Republica, além dos empresários e empreendedores em geral.

Assim sendo, e assim sendo realizado, em breve teremos concretos motivos para realmente comemorar a Semana do Meio Ambiente.


[1] Advogado. Pós-graduado em Direito de Empresas. Especializado em Direito Ambiental, Direito Empresarial Ambiental, Direito Agrário Ambiental, Direito Ambiental do Trabalho, Direito Minerário, Direito Sanitário, Direito de Energia, Direito em Defesa Agropecuária, e respectivas áreas afinsDireito Empresarial Ambiental, Direito Agrário Ambiental, e Direito Administrativo. Mestrado em Direito Internacional com ênfase em direito ambiental e direitos humanos. Professor de pós-graduação em direito e legislação ambiental de várias instituições de ensino. Palestrante. Parecerista. Consultor de empresas na área jurídico ambiental. Escritor de livros e artigos jurídicos em direito empresarial e direito ambiental. Consultor de portal www.mercadoambiental.com.br . Diretor da Aceti Advocacia www.aceti.com.br

[2] Advogada. Pós-graduada em Direito de Empresas. Especializada em Direito Empresarial Ambiental, Direito Contratual e Obrigações Financeiras. Integrante da Aceti Advocacia www.aceti.com.br

[3] Graduando em direito pela UNIFEOB. Estagiário da Aceti Advocacia www.aceti.com.br